Militão Augusto de Azevedo (Rio de Janeiro RJ 18371 - São Paulo SP 1905)
Fotógrafo e ator.
Tenta a sorte como ator e cantor lírico no Rio de Janeiro, entre 1858 e 1862, ano em que se muda para São Paulo e começa a fazer retratos e uma série de vistas da capital paulista para a Photographia Academica de Carneiro & Gaspar. É um dos retratistas da fotografia brasileira oitocentista mais produtivos, tendo realizado comprovadamente mais de 12.500 retratos ao longo de seus 25 anos de carreira. É como paisagista, no entanto, que se notabiliza, em virtude do Álbum Comparativo da Cidade de São Paulo: 1862-1887, no qual contrapôs vistas dos mesmos logradouros realizadas nessas duas datas, criando assim um modelo de fotografia paisagística urbana de enfoque comparativo. Efetua ainda importante documentação sobre a cidade portuária de Santos SP na década de 1870. Em 1996, o Museu Paulista adquire os álbuns de registro de clientes da Photographia Americana, em poder dos descendentes de Militão.
Notas
1 As fontes consultadas divergem em relação ao ano de nascimento do fotógrafo. Foi adotada a data de nascimento utilizada pelo Museu Paulista da Universidade de São Paulo - MP/USP, que detém a posse do acervo do artista. Outras fontes indicam 1840 como ano de seu nascimento.
Comentário Crítico
Militão Augusto de Azevedo nasce no Rio de Janeiro, mas vive boa parte de sua vida em São Paulo, onde morre em 24 de maio de 1905. Antes de se dedicar à fotografia, Militão é ator de teatro. Trabalha, no Rio de Janeiro, em diversas companhias, como a de Joaquim Heleodoro, entre 1858 e 1860, a Companhia Dramática Nacional, entre 1860 e 1862, e a de João Caetano, em 1869. Em 1862, muda-se para São Paulo e deixa em segundo plano a carreira no teatro. Encontra na fotografia uma forma mais rentável e segura de ganhar a vida. Passa a trabalhar como fotógrafo na Photographia Acadêmica de Carneiro & Gaspar.
No início da década de 1860, Militão realiza várias tomadas de São Paulo. São suas as primeiras imagens fotográficas da cidade, fundamentais para a compreensão do espaço urbano na época. Registra a cidade colonial, suas vielas e largos, principalmente a mancha urbana situada entre os rios Anhangabaú e Tamanduateí, com destaque para o largo São Francisco, o largo da Sé, a rua Direita, além dos caminhos que levam a Santos e ao Rio de Janeiro. Também fotografa as obras de implantação da ferrovia São Paulo Railway e a cidade de Santos.
Nota-se em seu trabalho a preocupação com as vistas panorâmicas. Suas tomadas são realizadas com base em pontos que possibilitam uma visão abrangente, podendo muitas vezes ser encaixadas para formar um todo contínuo. Para produzi-las utiliza o negativo de vidro de colódio úmido, cuja revelação deve ser feita logo após a tomada fotográfica, e o papel albuminado para os positivos - usa o albúmem produzido da clara de ovo. A revelação é feita em laboratório móvel instalado junto à câmara.
Para o pesquisador Sérgio Burgi, essa documentação da cidade de São Paulo equipara seu trabalho aos realizados, em fins da década de 1850 e princípio da década seguinte, no Recife e Rio de Janeiro, por Augusto Stahl (1824 - 1877) e Revert Henry Klumb, pois são raros os registros urbanos feitos no país nesse período.1 Militão também se dedica ao retrato, tendo produzido mais de 12.000 exemplares do gênero, em formatos, tamanhos e preços variados, para atender diversos clientes contaminados pela "febre" de se fazer fotografar.
Em 25 de novembro de 1875, Militão Augusto de Azevedo compra a Photographia Acadêmica de Joaquim Feliciano Alves Carneiro, que passa a se chamar Photographia Americana. O estúdio, considerado o estabelecimento fotográfico mais importante da cidade, tem por atividade básica o retrato e está estruturado de forma a atender ao gosto do cliente. Instalado em um sobrado, tem vários ambientes e um bom salão para poses, com diversos equipamentos fotográficos, mobílias finas e raras, bibelôs e adornos. Passam por seu estúdio figuras tradicionais da sociedade paulistana, tipos populares, crianças, coristas, estudantes da Faculdade de Direito e até o imperador dom Pedro II (1825 - 1891).
No ano de 1885, por dificuldades financeiras, Militão fecha a Photographia Americana, mas não deixa de fotografar. Passados 25 anos de suas primeiras tomadas da cidade, realiza o Álbum Comparativo da Cidade de São Paulo (1862-1887), em que registra vários locais fotografados anteriormente, tomados do mesmo ângulo, o que possibilita acompanhar as transformações urbanas, arquitetônicas e sociais ocorridas. O trabalho é composto de 60 fotos das quais 18 são pares comparativos. O próprio fotógrafo declara: "...eu quis despedir-me da fotografia fazendo o meu álbum Comparativo de São Paulo de 1862 a 1887. Parece-me um trabalho útil e talvez o primeiro que se tem feito em fotografia, porque ninguém terá tido a paciência de guardar clichês durante 25 anos".2
Seu álbum transcende o mero aspecto documental quando se leva em conta que, por trás da simples junção de duas imagens de um mesmo local, conseguidas com anos de diferença, se ampliam as potencialidades espaço-temporais da imagem fotográfica. Explorando a fotografia como um "quase-cinema", aquelas fotos em dupla, além de documentar as transformações da protometrópole, atestam o orgulho positivo do cidadão diante da cidade, que progride a olhos vistos e às novas tecnologias, que permitem registrar tal progresso de maneira supostamente objetiva e fiel.
É com base em imagens produzidas por Militão que Benedito Calixto (1853 - 1927) pinta alguns quadros com vistas da cidade, encomendados por Afonso d'Escragnolle Taunay (1876 - 1958), na época diretor do Museu Paulista, para a comemoração do centenário da Independência. Durante as primeiras décadas do século XX, suas fotografias foram publicadas, isoladamente ou em álbuns, sem a identificação do autor.
Notas
1 BURGI, Sérgio. Composição em preto-e-branco. In: SÃO Paulo: 450 anos. São Paulo: Instituto Moreira Salles . 2004. p. 40.
2 AZEVEDO, Militão. Militão Augusto de Azevedo: A Imagem Viva da Cidade. In: GERODETTI, João Emilio, CORNEJO, Carlos. Lembranças de São Paulo: a capital paulista nos cartões-postais e álbuns de lembranças. São Paulo: Studio Flash, 1999. p. 16.
Críticas
"(...) Tal como um professor de anatomia, o fotógrafo procurou dissertar seu assunto, a cidade, com isenção e método. Daí, talvez a primeira impressão que suas fotos causam um certo despojamento, uma certa humildade em face do objeto de seu trabalho, ou deveríamos resumidamente dizer, uma grande probidade (...)".
Benedito Lima de Toledo
AZEVEDO, Militão Augusto de. Álbum comparativo da cidade de São Paulo 1862-1887. São Paulo: Secretaria Municipal de Cultura,1981. p. 5.
São exatamente os aspectos que caracterizam a fotografia em todo o mundo, no século XIX: o portrait e a paisagem. Militão atuou nas duas áreas e nos deixou duas visões importantes em ambos os setores. Suas fotos têm a marca interpretativa tão essencial para aquilatarmos a participação pessoal do fotógrafo, retratando cenas de estúdio e de ruas, no período em que a cidade de São Paulo transforma-se de forma vertiginosa (...)".
Boris Kossoy
AZEVEDO, Militão Augusto de. Álbum comparativo da cidade de São Paulo 1862-1887. São Paulo: Secretaria Municipal de Cultura,1981. p. 31.
"É de 1º de junho de 1887, porém, a bela carta dirigida a seu grande amigo Portilho, na qual, deixando de lado a falta de dinheiro, as dificuldades da empreitada e as desilusões da cidade, Militão tem, pela primeira vez, a intuição da real importância artística e histórica do trabalho que está realizando: 'Como Verdi despedindo-se da música escreveu o seu Otelo, eu quis despedir-me da fotografia fazendo o meu. É um álbum comparativo de São Paulo de 1862 a 1887. Parece-me um trabalho útil, e talvez o primeiro que se tem feito em fotografia, porque ninguém terá tido a pachorra de guardar clichês de 25 anos. Tenho trabalhado muito e creio que nada farei. Conheces meu gênio: não sirvo para pedir. Neste trabalho andam um bocadinho de amor próprio de artista e gratidão ao lugar em que estou há 25 anos'.
Depois desta pausa em que se reconhece artista e realizador de uma obra não só útil como inédita e relevante, volta a irritação do desiludido homem de negócios, que desabafa ao amigo Heller: 'Eu ainda estou com o maldito álbum que, se nestes quinze dias ficar pronto, deve estar aí em setembro'.
O 'maldito álbum' fica realmente pronto no prazo estimado porque, no dia 11 de agosto de 1887, o jornal 'A Província de São Paulo' faz seu anúncio, acompanhado de um artigo: '(...) O interessante trabalho do sr. Militão, que é por sua vez atestado do progresso de sua arte, traz-nos recordações de outros tempos, da simplicidade e da atividade industrial da velha cidade. O confronto é agradável e útil. Comparado com as estatísticas, o álbum de vistas fotográficas do sr. Militão tem um grande valor para se verificar o progresso da província, medido pela transformação da capital em 25 anos'".
Ilka Brunhilde Laurito
LAURITO, Ilka Brunhilde. Retrato de um photographo. In: SÃO PAULO em três tempos: álbum comparativo da cidade de São Paulo (1862-1887-1914). São Paulo: IMESP, 1982. p. 13-15. (25 cadernos)
Acervos
Acervo Biblioteca Municipal Mário de Andrade - São Paulo SP
Acervo do Museu Paulista da USP - São Paulo SP
Acervo Secretaria Municipal de Cultura/DPH - Arquivo de Negativos - São Paulo SP
Coleção Gilberto Ferrez, Acervo do Instituto Moreira Salles - IMS
Coleção Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro - MAM/RJ - Rio de Janeiro RJ
Exposições Coletivas
1875 - Rio de Janeiro RJ - 4ª Exposição Nacional
Exposições Póstumas
1975 - São Paulo SP - Memória Paulistana, no MIS/SP
1976 - Nova York (Estados Unidos) - Pioneer Photographers of Brazil, 1840-1920, no The Center for Inter-American Relations
1981 - São Paulo SP - Álbum Comparativo da Cidade de São Paulo 1862/1887, no Masp
1982 - Exposição na Imprensa Oficial do Estado
1985 - Rio de Janeiro RJ - Dom Pedro II e a Fotografia Brasil, na Casa do Bispo
1986 - Paris (França) - La Photographie Brésilienne au Dix-Neuvième Siècle", Mois de la Photo
1987 - Ouro Preto MG - Aspectos da fotografia brasileira no século XIX, no Museu da Inconfidência
1988 - Texas (Estados Unidos) - Brazilian Photography in the Nineteenth Century, no Houston Fest
1988 - Novo México (Estados Unidos) - Brazilian Photography in the Nineteenth Century, no Maxwell Museum of Anthropology
1988 - São Paulo SP - O Negro na Iconografia Brasileira do Século XIX: A Visão Européia, na Faculdade de Geografia e História da USP
1993 - São Paulo SP - A Fotografia do Brasil no Século XIX - Do Pará a São Paulo, na Pinacoteca do Estado
1993 - São Paulo SP - São Paulo antigo, uma encomenda da Modernidade: as fotografias de Militao nas telas do Museu Paulista, no Museu Paulista
1994 - São Paulo SP - A Fotografia Contaminada, no CCSP
1995 - Rio de Janeiro RJ - Mestres da Fotografia no Brasil. Coleção Gilberto Ferrez, no CCBB
1995 - São Paulo SP - Álbum Comparativo da Cidade de Sao Paulo - 1862-1887-1995, no Solar da Marquesa de Santos
1997 - São Paulo SP - A cidade revisitada: 1860-1950, na Galeria da Consolação
1997 - São Paulo SP - A cidade revisitada: 1860-1950, no Solar da Marquesa de Santos
1997 - São Paulo SP - O Arquivo do Estado: sua historia, no Arquivo do Estado
1997 - São Paulo SP - São Paulo Antiga: 1862-1916, na Biblioteca Municipal Mário de Andrade
1997 - São Paulo SP - São Paulo nas lentes de Militão, no Museu Paulista
1999 - São Paulo SP - O Centro velho por Militao de Azevedo, no Sesc Paraíso
1999 - São Paulo SP - São Paulo e seus tempos, no Memorial do Imigrante
1999 - São Paulo SP - São Paulo em três tempos, na Capela Velha de São Miguel Paulista
2000 - Brasília DF - O Século XIX na Fotografia Brasileira: coleção Pedro Corrêa do Lago, no Ministério das Relações Exteriores. Palácio do Itamaraty
2000 - São Paulo SP - Café, no Banco Real
2000 - São Paulo SP - Cem Anos Luz, na Estação da Luz
2000 - São Paulo SP - Iconografia paulistana: São Paulo na passagem do século, na Biblioteca Municipal Mário de Andrade
2000 - São Paulo SP - Mostra do Redescobrimento. Negro de Corpo e Alma, no Pavilhão Padre Manoel da Nóbrega
2000 - São Paulo SP - São Paulo - De vila a metrópole, na Galeria Prestes Maia - Masp Centro
2000 - São Paulo SP - São Paulo em três tempos, na Câmara Municipal de São Paulo
2000 - São Paulo SP - Vistas da Boa Vista, no Itaú Personnalité
2000 - São Paulo SP - Vistas da Boa Vista, no Solar da Marquesa de Santos
2001 - São Paulo SP - Álbum comparativo da cidade de São Paulo, no Museu da Cidade de São Paulo
2002 - Rio de Janeiro RJ - Arquipélagos - o universo plural do MAM, no MAM/RJ
2002 - São Paulo SP - São Paulo 25 mil habitantes, na Pinacoteca do Estado
2003 - São Paulo SP - Negras memórias, memórias de negros: o imaginário luso-afro-brasileiro e a herança da escravidão, na Galeria de Arte do Sesi
2003 - São Paulo SP - São Paulo no coração - 449 anos, no Shopping Paulista - Piso 13 de Maio
2004 - São Paulo SP - Olho Cíclico: visualidade no século XIX, no Museu Paulista
2004 - São Paulo SP - Panoramas SP, no MIS/SP
2004 - São Paulo SP - São Paulo, 450 anos - A imagem e a memória da cidade no acervo do Instituto Moreira Salles, na Galeria de Artes do Sesi
Fonte: Itaú Cultural