Hugo Denizart (Rio de Janeiro RJ 1946)
Fotógrafo, psicanalista e professor cineasta, videomaker.
Psicanalista por formação, em 1973 abre um consultório de psicanálise. Como repórter fotográfico atua no Jornal do Brasil de 1971 a 1973. Em 1974 e 1975, faz os filmes Maruim e Vivendo, respectivamente sobre pescadores que perderam suas casas após as enchentes e sobre trabalhadores de cana-de-açúcar e retirantes. Em 1976, é convidado pelo Ministério da Saúde a fazer uma pesquisa com fotografias sobre doenças da população rural. De 1976 a 1980, é professor titular das disciplinas de fotografia e psicologia, no Centro Unificado Profissional, Rio de Janeiro. Nessa cidade, participa de sua primeira coletiva em 1977, na galeria Grafitti. No ano seguinte, faz individual na galeria Andréa Sigaud e inicia um projeto de fotografia na Cidade de Deus, ambos no Rio de Janeiro. Participa de mostras em Arles e Paris, na França, em Nova York e em São Paulo. Lança os documentários Líderes de Quadrilha, Prisioneiro da Passagem e Região dos Desejos, em 1980, 1982 e 1983. É premiado no 12º Salão Nacional de Arte de Belo Horizonte, em 1980, e no 6º Salão Nacional de Artes Plásticas da Funarte, Rio de Janeiro, em 1983. Participa da Bienal de Fotografia em 1984, em Havana, e em 1987, em Roterdã, na Holanda. Em 1997, lança o livro Engenharia Erótica: travestis no Rio de Janeiro, com fotos e entrevistas.
Comentário crítico
As fotografias de Hugo Denizart unem interesses estéticos, psicanalíticos e antropológicos, segundo o crítico Roberto Pontual.1 A partir de 1978, seus ensaios fotográficos têm por tema a Cidade de Deus, os internos da Colônia psiquiátrica Juliano Moreira, as prostitutas da Vila Mimosa e os travestis da praça Tiradentes. Ainda segundo o crítico, suas fotos tratam da marginalização social e também de homens e mulheres confinados nas instituições para doentes mentais, pela perda de contato com a realidade.
As fotos evidenciam fraturas. Algumas mostram apenas partes das pessoas, como a ponta de um pé sujo com unhas mal pintadas de vermelho, vista por quatro ângulos diferentes; ou braços, mãos e olhos de pacientes psiquiátricos, diante de fragmentos de uma bandeira do Brasil pintada na parede. Em outras obras, ele ressalta o distanciamento social. Por exemplo, em um trabalho, vêem-se dois homens com os rostos cobertos por panos furados nos olhos, olhando para baixo, atrás de uma mesa com revólveres e balas, copos e cigarros.
Sobre sua atividade, Denizart diz: "A fotografia é uma maneira de eu aprender a vida. É um momento em que consigo enxergar as coisas com muita lucidez, e acredito que foram poucas as vezes em que apertei o botão da máquina com indiferença."2
Notas
1 CORPO & alma: fotografia contemporânea no Brasil. Curadoria e texto Roberto Pontual. Rio de Janeiro: Instituto Nacional da Fotografia da Funarte, 1984. Livreto não paginado e folders. [Exposição produzida pelo Instituto Nacional da Fotografia da Funarte - Fundação Nacional de Arte e apresentada no Espaço Latino - Americano em Paris, nov. 1984.]
2 XII SALÃO NACIONAL DE ARTE DE BELO HORIZONTE, Belo Horizonte, 1980. XII Salão Nacional de Arte de Belo Horizonte: a cidade faz. Belo Horizonte: Museu de Arte de Belo Horizonte, 1980. Não paginado, p&b.
Críticas
"Hugo Denizart, psicanalista e fotógrafo, quer desmascarar o óbvio aceito como verdade. Ele se recusa a ser cúmplice da despersonalização dos pacientes pela imagem; ele se recusa a tornar-se um assassino, mais um, da identidade de ser humano, a única riqueza que lhe tinha sobrado. Ele não vai produzir imagens para satisfazer as expectativas do mundo ´normal´, registros de rostos sem rosto. Ele doma a câmera e ordena ser gentil com esses seres-antes-humanos e registra imagens imprevisíveis. O fotógrafo faz explodir o mundo aprisionado em fragmentos para sublinhar as diferenças, para destacar as individualidades e uni-las depois, a sua maneira. Ele cria um mundo novo, o de interações inesperadas, imprevistas, coerentes.
(...) Quanta força, beleza e ternura encontram-se no trabalho de Denizart. O mundo que explodiu em fragmentos ordena-se. Cada fragmento possui vida própria. Juntos se desafiam, se atraem, painéis sóbrios, painéis chocantes. A cor esbarra e coexiste com o branco e o preto, na vida e no painel.
Um fragmento pode ser sintético? Parece um raciocínio ad absurdum, mas não o é para Hugo Denizart. Ele estabelece uma nova equação: fragmento igual soma, fragmento igual à essência absoluta do ser humano.
(...) A fotografia (...), na mão e no olhar de Hugo Denizart, encontra um caminho novo. Bonito. O de devolver ao ser humano, através do fazer fotográfico e através de imagem, a sua identidade. Aquela que os outros homens e não a câmera lhe tinham roubado".
Stefania Bril
O Estado de São Paulo, 13 de julho de 1984
Depoimentos
"Fotografando, me choco com as leis férreas constitutivas do ato fotográfico, tipo de máquina, de lentes, técnicas de fotometragem (medição de luz ), tipos de filmes e outros (...). Arcabouço técnico-jurídico de regulamentações. A fotografia fala diretamente aos objetos. A sua regularidade e sua necessária semelhança me causam inquietude. Uma intervenção radical faz-se necessária, um ato de conceber nômade, enganar a própria máquina, acreditar na mentira.
(...) Fotografar tem um compromisso com a pureza, com o congelamento do real. O afastamento dessa perspectiva santificada não é apenas uma escolha pessoal, uma quantidade de fluxos me empurra para outros campos. Há uma dor, a repetição sempre dá uma ilusão de pertinência, a invenção, que se materializa como pura diferença (fantasma), gera um sentimento de solidão por relação a um desejo que sua essência é falta. A invenção se constitui como um desafio-combate, desterritorialização. Mas é curioso que não deixo de sentir um mal-estar cada vez que olho o resultado das minhas fotografias e vejo que elas falam não reprodutivamente dos ambientes aos quais elas se dedicam. Regidas pelos sonhos do desejo, vivendo e deixando viver em permanente expansão de conexões múltiplas. Atravessando as janelas apertadas das regras, produzindo um campo de forças que transformem o mundo platônico em pura desordem, para que não se reorganize em nenhum tempo jamais.
A fotografia é uma maneira de eu aprender a vida. É um momento em que consigo enxergar as coisas com muita lucidez, e acredito que foram poucas as vezes que apertei o botão da máquina com indiferença".
Hugo Denizart
INVENTANDO Corpos. Rio de Janeiro: Centro Cultural Cândido Mendes, 1987.
Exposições Individuais
1977 - Rio de Janeiro RJ - População Rural Marginalizada, na Galeria Grafitti
1978 - Rio de Janeiro RJ - Galeria Andréa Sigaud
1980 - Rio de Janeiro RJ - Poder Perverso, na Galeria Cândido Mendes
1981 - Rio de Janeiro RJ - Galeria Cândido Mendes
1981 - Nantes (França) - Suíte Série Sequence, no Centre Culturel Graslin
1983 - Rio de Janeiro RJ - Galeria de Arte Cândido Mendes
1983 - Rio de Janeiro RJ - Galeria de Arte da Faculdade da Cidade
1984 - São Paulo SP - Individual, no MIS/SP
Exposições Coletivas
1980 - Arles (França) - La Photographie Brésilienne - XI Rencontre Internationale de la Photographie
1980 - Nova York (Estados Unidos) - Center for Inter-American Relations
1980 - Nova York (Estados Unidos) - Exposição Latino-Americana de Fotografia, no Center for Inter American Relations
1980 - Paris (França) - Salon d´Automne
1980 - São Paulo SP - 50 Anos de Kodak no Brasil, no Masp
1981 - Belo Horizonte MG - 13º Salão de Arte - Premiado
1981 - Paris (França) - Salon d´Automne
1981 - Rio de Janeiro RJ - Do Moderno ao Contemporâneo - Coleção Gilberto Chateaubriand, no MAM/RJ
1981 - São Paulo SP - Foto/Idéia, no MAC/USP
1982 - Belo Horizonte MG - 14º Salão Nacional de Arte Contemporânea de Belo Horizonte, no Museu de Arte da Pampulha
1982 - Piauí - 7º Salão de Artes - Premiado
1982 - Rio de Janeiro RJ - À Margem da Vida, sobre pacientes psiquiátricos, no MAM/RJ
1982 - Rio de Janeiro RJ e São Paulo SP - Prisioneiro da Passagem, no Congresso Internacional de Psiquiatria e Seminário Saúde e Loucura
1983 - Barcelona (Espanha) - Exposição coletiva
1983 - Paris (França) - Le Brésil des Brésiliens, no Centro Georges Pompidou
1983 - Rio de Janeiro RJ - 6º Salão Nacional de Artes Plásticas, no MAM/RJ - Prêmio Gustavo Capanema
1983 - Rio de Janeiro RJ - Tempo do Olhar, organizada pelo "Jornal do Brasil", no Museu de Belas Artes
1983 - Santiago do Chile (Chile) - Centro de Estudios Brasileños
1983 - São Paulo SP - Arco, na Galeria de Arte Contemporânea
1984 - Belo Horizonte MG - 16º Salão Nacional de Arte, no Museu de Arte de Belo Horizonte
1984 - Fortaleza CE - 7º Salão Nacional de Artes Plásticas
1984 - Paris (França) - Photographie Contemporaine au Brésil: Corps et Âme, Espace Latine Américain à Paris - Mois de la Photo
1984 - Rio de Janeiro RJ - 7º Salão Nacional de Artes Plásticas, no MAM/RJ
1984 - São Paulo SP - Arco, na Galeria de Arte Contemporânea
1984 - São Paulo SP - Tradição e Ruptura na Arte Brasileira, na Fundação Bienal
1985 - Rio de Janeiro RJ - 8º Salão Nacional de Artes Plásticas, no MAM/RJ
1985 - São Paulo SP - Fotografia dos Anos 70, na Fotoptica e no MAC/USP
1985 - São Paulo SP - 1º Quadrienal de Fotografia, no MAM/SP - Categoria hors-concours
1986 - Belo Horizonte MG - 9º Salão Nacional de Artes Plásticas: sudeste, na Fundação Clóvis Salgado. Palácio das Artes
1986 - Rio de Janeiro RJ - Salão Nacional
1987 - Rio de Janeiro RJ - Galeria de Arte Cândido Mendes
1987 - São Paulo SP - Arco, na Galeria de Arte Contemporânea
1987 - São Paulo SP - Foto/Idéia, no MAC/USP
1987 - São Paulo SP - Galeria de Arte Cândido Mendes
1988 - Olinda PE - 41º Salão de Arte Contemporânea de Pernambuco, no Centro de Convenções de Pernambuco
1990 - Roterdã (Holanda) - Bienal de Fotografia
1991 - Rio de Janeiro RJ - Imagem da Criança Brasileira, no Paço Imperial, no MAM/RJ e no Museu Nacional de Belas Artes
1991 - Rio de Janeiro RJ - Orquestra de Câmeras
1992 - Rio de Janeiro RJ - Rio de Janeiro: retratos da cidade 1840/1992, no CCBB
1995 - Rio de Janeiro RJ - Exposição de painel eletrônico sobre a Vila Mimosa, em praças públicas
1996 - São Paulo SP - Exposição de painel eletrônico sobre a Vila Mimosa, em praças públicas
1998 - Rio de Janeiro RJ - A Imagem do Som de Caetano Veloso, no Paço Imperial
1998 - São Paulo SP - Coleção Pirelli/Masp de Fotografias, no Masp
2000 - Londrina PR - Memória do Corpo, na Universidade Estadual de Londrina - UEL/PR
2003 - Rio de Janeiro RJ - Vinte e Cinco Anos: Galeria de Arte Cândido Mendes, na Galeria Candido Mendes
Fonte: Itaú Cultural