Benedito Bastos Barreto (São Paulo SP 1897 - idem 1947)
Caricaturista, desenhista, pintor, ilustrador, escritor, jornalista, historiador.
Inicia sua carreira em 1912, publicando suas primeiras caricaturas na revista paulista Rio Branco e paralelamente colabora na revista carioca D. Quixote. Durante seus primeiros anos de trabalho publica em diferentes periódicos paulistas e, em 1921, emprega-se na recém-inaugurada Folha da Noite, substituindo Voltolino (1884 - 1926). Nesse periódico passa a utilizar o pseudônimo Belmonte como assinatura de seus desenhos e em 1925 cria o personagem Juca Pato. Durante a Revolução Constitucionalista de 1932 cria o logotipo para os bônus de guerra que no período das batalhas substituíram como dinheiro a moeda oficial. Nos anos seguintes, trabalha como colaborador no suplemento infantil do jornal A Gazeta, onde cria os personagens Albina e Paulino que, através de uma linguagem mais acessível, propagavam entre as crianças os ideais constitucionalistas dos revolucionários paulistas. Entre os anos 1929 e 1937, ilustra cinco livros infantis escritos por Monteiro Lobato (1882 - 1948). No ano de 1936, começa a publicar no jornal Folha da Manhã diversas charges de Juca Pato tendo como temática a crítica ao nazismo. Produzidas até o ano de 1946, elas acabam se configurando numa grande série sobre a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Essas charges são reunidas e publicadas em 1982, pela Editora Melhoramentos, com o título de Caricatura dos Tempos. Autor de diversos livros de caricatura e história, publica entre outros os seguintes títulos: Assim Falou Juca Pato (1933), No Tempo dos Bandeirantes (1939) e O Brasil de Ontem (1940), com desenhos inspirados nos trabalhos de Rugendas (1802 - 1858).
Comentário Crítico
Benedito Barros Barreto, Belmonte, é um dos caricaturistas mais importantes em atividade em São Paulo na primeira metade do século XX. De seu traço nasce uma das figuras mais populares da história da imprensa paulista: o personagem Juca Pato. Autodidata, Belmonte inicia-se cedo na atividade de ilustrador. Seu primeiro desenho é publicado na revista Rio Branco, em 1912. No ano seguinte passa a ser um dos principais colaboradores da revista Alvorada, assinando as ilustrações como Barreto, e de outras publicações como: Miscellanea, Radium, Cosmos, Revista da Semana, Dom Quixote, Fon-Fon!. Apesar da relativa notoriedade no fim dos anos 1910, seu desenho mostra-se bastante influenciado pelo grande caricaturista J. Carlos (1884 - 1950), a quem reconhece como mestre e de quem nunca se liberta completamente.
A transformação do ilustrador Barreto no chargista Belmonte dá-se em 1921, quando é convidado pelo amigo o jornalista Paulo Duarte a substituir Voltolino (1884 - 1926), caricaturista da vida paulistana na Folha da Noite. Suas charges diárias, por vezes com referências eruditas, tratam tanto de política quanto do cotidiano da cidade, como o descaso das autoridades pelos monumentos públicos, a urbanização desenfreada que derruba prédios, o problema da arborização, as pichações políticas. As denúncias ganham força com Juca Pato, personagem inventado por Lellis Vieira, redator de política do jornal, que encontra sua forma gráfica perfeita nas mãos de Belmonte. Baixinho, careca, óculos de tartaruga, fraque, polainas e gravata-borboleta, Juca Pato representa o cidadão paulista de classe-média em seus anseios e reivindicações. A popularidade do personagem reclamador e defensor da coletividade pode ser medida pelo fato de que nos anos 1930 seu nome aparecer associado a cavalos de corrida, cigarro, caderno, bala, bar, produtos de uso doméstico e tema de tango.
A acuidade e o estilo satírico de Belmonte mostram-se sobretudo nas charges realizadas entre 1936 e 1946 na Folha da Noite, comentando a política internacional, particularmente o nazismo. Pelos seus traços é possível acompanhar toda a decadência física e moral de Adolf Hitler na Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Nessa época Belmonte torna-se famoso no exterior, publicando charges e caricaturas de líderes mundiais em publicações francesas, inglesas, norte-americanas, argentinas e portuguesas. Seu trabalho repercute a ponto de, numa transmissão radiofônica, o ministro da propaganda de Hitler, Goebbels, acusá-lo de desenhar a serviço dos aliados. No plano nacional, ele não poupou o Estado Novo de Getúlio Vargas em seus comentários mordazes, chegando a ser censurado.
Estudiosos da obra de Belmonte parecem estar de acordo quanto a sua contribuição para a história da caricatura e da charge política no Brasil, que estaria muito mais na capacidade de percepção dos fatos do que propriamente no desenho. Na verdade, aponta-se com freqüência uma certa falta de originalidade em seu traço. Para o historiador Herman Lima, o excesso de apuro de seu desenho, em que nenhum detalhe é esquecido, acaba gerando uma rigidez e falta de espontaneidade do traço, que fazem suas charges perderem muito do espírito e da graça.
Sua capacidade analítica leva-o a dedicar-se a múltiplas atividades intelectuais. Com o passar dos anos, sem abandonar a charge, começa a escrever crônicas diárias para o jornal, nas quais exercita suas críticas, posteriormente reunidas nos volumes Assim Falou Juca Pato e Idéias de João-Ninguém. Como pesquisador da história paulista, publica No Tempo dos Bandeirantes, retrato aprofundado dos primórdios da ocupação de São Paulo, no qual sobressai o rigor do levantamento histórico. Esse rigor é observado nas ilustrações, em que se busca a precisão na apresentação do período retratado. A qualidade de seu desenho documental aparece em outros volumes como Povos e Trajes da América Latina, de Egon Schaden, e História do Brasil para Crianças, de Viriato Corrêa. Ilustra também algumas edições dos livros infantis de Monteiro Lobato e sua versão para as personagens infantis do escritor passaram quase a encarnar as criações de Lobato.
Críticas
"A preocupação do detalhe e o refinamento da elaboração gráfica, na sua fatura habitual, determinavam inevitavelmente o sacrifício do sentido de apreensão imediata que é um dos principais elementos duma boa charge, a ponto de muita vez o trabalho do verdadeiro caricaturista dar a impressão de ter sido feito a jato, sair-lhe fumegante das mãos, como o ferro batido da forja, tal na obra dum Daumier ou dum Bordalo Pinheiro.
O recurso freqüente a fontes históricas, bíblicas e literárias, se bem que fruto de sua larga cultura, como as legendas, tantas vezes um tanto rebuscadas, são outro elemento perturbador da clareza de que se deve revestir a caricatura, na sua função precípua de caracterizar rapidamente um tipo ou uma situação. Se, muita vez, como também é verdade, Belmonte conseguia efeitos realmente cômicos ou impressivamente dramáticos, com esse apego e temas eruditos, suas charges também perdiam muito do espírito e da graça que teriam, simplificadas que fossem a sua concepção e execução.
Autor de famosas sátiras contra o fascismo e o nazismo, que tantas ameaças lhe valeram dos seus adeptos no Brasil, o espíirito clássico dessas composições lhes diminuía evidentemente o alcance objetivo que poderiam ter sem aquela excessiva roupagem literária".
Herman Lima
LIMA, Herman. Os contemporâneos (conclusão). In: ______. História da caricatura no Brasil. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1963. v. 4, p. 1364. Cap. 12.
"Depois que Voltolino desapareceu, tragado ainda tão jovem pela sua incurável boêmia, ficou Belmonte o caricaturista único de São Paulo. Convencidos da inutilidade de qualquer esforço no combate às nossas mazelas, os que hoje vêm ao mundo com o dom da caricatura não o cultivam. Preferem entrar para o campo do desenho industrial. Essa abstenção, cada dia maior, vai deixando Belmonte sozinho. Só êle mantém viva entre nós, de São Paulo, a tradição caricatural. Mas a mantém com extraordinário brilho, porque além do dom natural do desenho humorístico, possui uma coisa rara entre artistas; cultura e sólido bom sendo. Belmonte é um artista integral. Tanto caricatura com o lápis como por meio da palavra escrita. Quero dizer que é um escritor notável - desses cujas crônicas os jornais estampam em tipo e relevo. A mesma finura de humor que mostra no desenho ressalta dos seus comentários escritos".
Monteiro Lobato
LOBATO, Monteiro apud LIMA, Herman. Os contemporâneos (conclusão). In: ______. História da caricatura no Brasil. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1963. v. 4, p. 1372. Cap. 12.
Exposições Coletivas
1940 - São Paulo SP - 7º Salão Paulista de Belas Artes, no Salão de Arte Almeida Júnior da Prefeitura Municipal de São Paulo
1947 - São Paulo SP - 13º Salão Paulista de Belas Artes, na Galeria Prestes Maia
Exposições Póstumas
1967 - São Paulo SP - 9ª Bienal Internacional de São Paulo, na Fundação Bienal
1974 - São Paulo SP - Tempo dos Modernistas, no Masp
1975 - São Paulo SP - O Modernismo de 1917 a 1930, no Museu Lasar Segall
1984 - São Paulo SP - Tradição e Ruptura: síntese de arte e cultura brasileiras, na Fundação Bienal
1993 - Goiânia GO - Belmonte e seu Tempo, na Itaugaleria
1993 - Campo Grande MS - Belmonte e seu Tempo, na Itaugaleria
1993 - Rio de Janeiro RJ - Emblemas do Corpo: o nu na arte moderna brasileira, no CCBB
1995 - São Paulo SP - Modernismo Paris Anos 20: vivências e convivências, no MAC/USP
1997 - São Paulo SP - O Humor Gráfico nos Anos 30, 40 e 50, no Itaú Cultural
1997 - Belo Horizonte MG - O Humor Gráfico nos Anos 30, 40 e 50, no Itaú Cultural
1998 - Brasília DF - O Humor Gráfico nos Anos 30, 40 e 50, na Galeria Itaú Cultural
1998 - Penápolis SP - O Humor Gráfico nos Anos 30, 40 e 50, na Galeria Itaú Cultural
1998 - São Paulo SP - Iconografia Paulistana em Coleções Particulares, no Museu da Casa Brasileira
2000 - Valência (Espanha) - De la Antropofagia a Brasilia: Brasil 1920-1950, no IVAM. Centre Julio Gonzáles
2001 - São Paulo SP - Caricaturistas Brasileiros, no Instituto Cine Cultural
2002 - São Paulo SP - Da Antropofagia a Brasília: Brasil 1920-1950, no MAB/Faap
2004 - São Paulo SP - O Preço da Sedução: do espartilho ao silicone, no Itaú Cultural
Fonte: Itaú Cultural