Antônio Nássara (Rio de Janeiro RJ 1910 - idem 1996)
Caricaturista, compositor.
Em 1929, Antônio Gabriel Nássara iniciou o curso de arquitetura da Escola Nacional de Belas Artes - Enba e emprega-se como retocador de fotografias na seção de desenho do jornal A Crítica onde conhece o caricaturista Guevara (1904 - 1964), que influencia seu traço. Nesse mesmo ano, publica alguns trabalhos no jornal A Noite e funda o Conjunto da Enba com Jota Rui, Barata Ribeiro, Manuelito Xavier, Jaci Rosas e Luis Barbosa (1910 - 1938). Com esse grupo musical compõe seus primeiros sambas. Em 1930, como paginador no jornal O Globo, conhece os modernos métodos de impressão e ilustração. Em 1931, abandona o curso de arquitetura e trabalha como paginador no jornal A Esquerda, no qual publica diversas caricaturas. No ano seguinte, Mário Reis (1907 - 1981) e Francisco Alves (1898 - 1952) gravam o samba de sua autoria intitulado Formosa. A música faz sucesso no carnaval carioca de 1933. Como compositor tem gravados aproximadamente 200 sambas e marchas de 1932 a 1970. De 1935 a 1952 colabora com diversas revistas cariocas como O Cruzeiro, onde publica, entre 1943 e 1945, uma série de charges sobre a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), Revista Carioca, Vamos Ler e Diretrizes. Em 1950, convidado por Samuel Wainer (1912 - 1980), trabalha no jornal Última Hora como paginador do 2º Caderno e realiza caricaturas dos políticos da época. Posteriormente ilustra alguns livros e, em 1974, emprega-se no semanário O Pasquim, onde trabalha com Jaguar (1932), Ziraldo (1932) e Millôr Fernandes (1923) até 1983. Em 1996, um mês antes de falecer, conclui sua última obra, 30 desenhos para o livro infantil, Moça Perfumosa, Rapaz Pimpão, escrito por Daniela Chindler.
Comentário Crítico
Nássara estréia na imprensa carioca no jornal O Globo, em 1927, com desenho que acompanha a reportagem de Eduardo Bahout sobre a travessia do Atlântico realizada pelo hidroavião Jahú. Euricles de Matos, redator-chefe do jornal, encoraja o jovem Nássara a continuar na carreira, o que ocorre alguns anos depois. Em 1928, ingressa no curso de arquitetura da Escola Nacional de Belas Artes - Enba, e divide o tempo entre os estudos e os grupos de samba, choro e marcha que forma com outros estudantes. Ele tem as primeiras aulas formais de desenho particularmente com Modesto Brocos (1852 - 1936), que o aconselha a abandonar o desenho acadêmico e aponta sua vocação para a caricatura.
Em 1929 Nássara publica três caricaturas em O Globo e inicia uma carreira, de êxito, que dura até sua morte. É levado para a revista A Noite pelo caricaturista Fritz (1895 - ca.1969), em 1930, colaborando também nessa década com as publicações Crítica, Carioca e Vamos Ler. Nássara trabalha em revistas e jornais brasileiros importantes, destacando-se sua contribuição em Diretrizes e as duas páginas semanais em cores para a revista O Cruzeiro, na década de 1940. Segundo alguns estudiosos, essas páginas de humor semanais constituem a melhor fase de sua atividade artística. Em suas charges e caricaturas desfilam figuras internacionais e nacionais ligadas à 2ª Guerra Mundial (1939-1945), com humor profundamente antifascista, e cenas do cotidiano do carioca.
Assim como outros jovens desenhistas surgidos nos anos 1930, Nássara é influenciado pelo grande caricaturista da época, o carioca J. Carlos (1884 - 1950). Posteriormente conhece o traço geometrizado e a caricatura em meio-tom do paraguaio radicado no Brasil Guevara (1904 - 1964). Aliado às aulas de história da arte na Enba, o contato com a modernidade visual de George Grosz (1893 - 1959), das revistas Vanity Fair e Simplicissimus, e artistas de vanguarda como Pablo Picasso (1881 - 1973) e Henri Matisse (1869 - 1954), ajuda-o a formar seu estilo, cedo descoberto.
As charges e caricaturas de Nássara se caracterizam pelas linhas econômicas e formas geometrizadas, em que tudo é redutível a esferas, cones, ovóides combinados entre si. Como nota Millôr Fernandes (1923), Nássara é o "Mondrian do portrait-charge, corrige a natureza fazendo com que as personagens acabem se parecendo com a caricatura". Há em seus desenhos um trabalho de abstração do real, sem que se perca a fisionomia do caricaturado. No entanto, não há interesse pelo exame psicológico dos personagens. Segundo o chargista Jaguar (1932), ele faz "logotipos" das pessoas que retrata. Entre seus portraits-charge mais famosos estão Napoleão Bonaparte (1769 - 1821), Getúlio Vargas (1882 - 1954) - quase sempre de perfil -, Jânio Quadros (1917 - 1992), Candido Portinari (1903 - 1962), Grande Otelo (1915 - 1993), Carmem Miranda (1909 - 1955) e Noel Rosa (1910 - 1937).
Nos anos 1950, Nássara ajuda a fundar, com o jornalista Samuel Wainer (1912 - 1980), o jornal Última Hora, no qual mantém página dupla em cores com crônica do cotidiano do Rio de Janeiro. Em 1974, começa a colaborar para o jornal de humor O Pasquim. Nesse momento, inicia-se a segunda fase de sua carreira, em que é descoberto e admirado por uma geração de caricaturistas mais novos. Permanece ali até 1983, com o mesmo humor afiado e traço econômico e certeiro dos primeiros tempos. Dessa fase destacam-se retratos das novas personalidades da música como Caetano Veloso (1942) e Maria Bethânia (1946), caricaturas das figuras políticas, como Jânio Quadros, Ulisses Guimarães (1916 - 1992), Paulo Maluf (1931) e Delfim Netto (1928) e dos presidentes militares, reunidos na charge clássica Corrente pra Trás, de 1982.
Como compositor, Nássara faz diversas músicas, sobretudo marchinhas de carnaval hoje antológicas, como Formosa, seu primeiro sucesso em 1932 gravada por Francisco Alves (1898 - 1952) e Mário Reis (1907 - 1981), Alá Lá Ô, e o grande hit Balzaquiana (1950), que ganha versão para o francês de Michel Simon. Em 1972, Nássara desenha 12 capas de disco para a série No Tempo dos Bons Tempos, do selo Fontana.
Críticas
"Por esse tempo, Nássara sofria ainda como Theo, Alvarus, Mendez e Martiniano, uma evidente influência de Guevara, cuja arte dominadora se projeta, de maneira impressionante, nos jovens caricaturistas da década de 1925-35. Essa influência, entretanto, por mais forte que fosse, não consegue eliminar a espontaneidade do caricaturista realmente original que Nássara sempre foi, por mais que se deixe levar inexplicavelmente pelo reflexo de alheias marcas, como tem acontecido (...) É que se trata dum lápis duma verve contundente, duma graça não raro hilariante, não só pela execução vigorosa e sintética em extremo, como pela concepção cheia de subentendidos, o que se verifica do mesmo modo nos seus portraits-charges e nas suas humoradas da melhor espécie.
Terrível satirizador da máscara humana, quando o quer, já em 1934 nos dava alguns retratos deformantes de irresistível comicidade, como os de Borges de Medeiros, Otávio Mangabeira, Gustavo Capanema, Artur Bernardes ou Getúlio Vargas, de quem criou mesmo uma esplêndida caracterização".
Herman Lima
LIMA, Herman. História da caricatura no Brasil IV. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1963. p. 1533.
"Por algum tempo, defendi a opinião de que uma parcela da dificuldade de leitura de seu trabalho era criada pelo próprio Nássara, na medida em que boa parte de seus desenhos é acompanhada de inscrições, legendas, até mesmo longos textos,-o que distrai da qualidade gráfica a atenção do público. Hoje suponho que sem o suporte do humor verbal seus "bonecos" não tivessem sido publicados. Numa perfeita inversão, os desenhos eram feitos porque toda a publicação tinha que manter uma página humorística. Nássara harmoniza em seu trabalho o contraste entre essa total adaptação às condições do real, no que diz respeito ao como, com aquela referida autonomia incondicional que determina nele o quê. O atestado disso é todo o seu trabalho, os finos desenhos que ele produz de linhas gróssissimas e uma crescente economia de elementos (...)".
Cássio Loredano
LOREDANO, Cássio. Nássara: desenhista. Rio de Janeiro: Funarte, 1985. p. 45.
"Ídolo da nova geração de caricaturistas brasileiros, Nássara teve após os 60 anos a oportunidade de uma nova carreira, no Pasquim, onde colaborou com seus admiradores Jaguar, Millôr e Ziraldo na metade dos anos 70, inaugurando uma nova fase que muitos consideram o ponto alto de seu desenho. Seu traço extremamente original pode parecer espontâneo pela economia de elementos, mas é fruto de longa elaboração e de muitos desenhos preparatórios, como observou justamente Cássio Loredano, seu biógrafo, que define de forma brilhante a arte de Nássara como "finos desenhos de linhas grossíssimas".
Pedro Corrêa do Lago
LAGO, Pedro Corrêa do. Caricaturistas brasileiros: 1836-1999. Rio de Janeiro: Sextante Artes, 1999. p. 126.
Exposições Individuais
1995 - Rio de Janeiro RJ - Individual de desenhos, no MNBA
Exposições Coletivas
1978 - São Paulo SP - 1ª Bienal Latino-Americana de São Paulo, na Fundação Bienal
1985 - Rio de Janeiro RJ - Velha Mania: desenho brasileiro, na EAV/Parque Lage
Exposições Póstumas
1997 - São Paulo SP - O Humor Gráfico nos Anos 30, 40 e 50, no Itaú Cultural
1997 - Belo Horizonte MG - O Humor Gráfico nos Anos 30, 40 e 50
1998 - Brasília DF - O Humor Gráfico nos Anos 30, 40 e 50
1998 - Penápolis SP - O Humor Gráfico nos Anos 30, 40 e 50
2001 - São Paulo SP - Caricaturistas Brasileiros, no Instituto Cine Cultural
Fonte: Itaú Cultural